Foi em Milão, na Itália, que surgiu a receita do pão doce com frutas cristalizadas que ganhou o mundo. Ainda que outras cidades da região da Lombardia também possuam preparações diferenciadas do panetone, foi a receita de Milão que ganhou o país e, logo, o mundo. Farinha, água, ovo, açúcar e manteiga são a base da preparação original, que é feita pelo processo de fermentação natural, conferindo a textura e o aroma típicos do doce.
A popularização do pão doce com frutas no país europeu começou por volta da década de 1930 quando as primeiras fábricas especializadas começaram a surgir. Para a chef patissier formada em confeitaria na Itália, Carolina Garofani, o consumo de panetone foi incorporado à cultura italiana natalina com facilidade por ser um produto propício para os dias mais frios. “É um pão de alta durabilidade, com bastante gordura e que resiste a todo o inverno.”
Nos países da América do Sul, o consumo do panetone é uma tradição que veio junto com os imigrantes italianos e que logo passou a fazer parte do cardápio das festas de fim de ano. Em maior ou menor escala – e com algumas variações – todos os países da região produzem sua versão do pão doce com frutas ou com chocolate. No Brasil, o panetone começou a se popularizar na década de 1950, quando que o imigrante Carlo Bauducco passou a preparar e vender a receita que trouxe da Itália.
Hoje, o costume de comer o panetone nas festas de fim de ano já faz parte da tradição de famílias dos países sul-americanos. E o Brasil assume a dianteira nesse cenário com as vendas do produto em constante alta. Para 2017, a APAS – Associação Paulista de Supermercados prevê um aumento de pelo menos 10% nas vendas em todo o país. Em 2016, o aumento foi também de 10% e, em 2015, de 7%.
Jeferson Vilso Trevizan, professor de panificação e confeitaria do Centro Europeu, explica que grande parte do aumento do consumo nos últimos anos também se deve aos novos recheios e coberturas do panetone.
Nossos vizinhos, Argentina, Uruguai e Paraguai mantém a tradição de comer o panetone mais tradicional, com frutas secas e cristalizadas. “É chamado de pan dulce e segue a receita tradicional italiana. Em relação ao produto consumido no Brasil, tem a massa um pouco mais firme e com mais sabor de baunilha, mas é bastante similar”, explica o chef uruguaio radicado no Brasil Leonardo de León. Outra diferença é que nesses países existem poucas marcas que fazem o produto em escala industrial, sendo a maioria dos produtos produzidos por pequenas padarias de bairro, que mantém a tradição de suas receitas ano após ano.
Na Colômbia, o pão de natal é chamado de pan de frutas europeo e também segue a receita mais tradicional. Na Venezuela, é conhecido porpanettone ou panetón e é consumido nas festas de final de ano junto com ponche crema – bebida alcoólica que leve açúcar, leite e ovos. No Peru, onde também é chamado de panetón, o costume é de comê-lo acompanhado de chocolate quente.
Já no Chile o pan de pascua é o bolo típico do Natal e tem sabor e apresentação diferentes em relação ao produto brasileiro. A massa é mais escura e a receita leva especiarias, como cravo, canela e gengibre. Enquanto o panetone tradicional é mais alto, o pan de pascua tem forma mais achatada. Além disso, a tradição é consumi-lo junto com uma bebida chamada de cola de mono, preparada com aguardente, leite, café, açúcar e especiarias.
De doce de leite a bacon
Nos últimos anos, novos ingredientes têm sido adicionados à receita do pão doce, expandindo o mercado. “E isso não é algo exclusivo do Brasil. Na Itália também vemos o produto com chocolate, por exemplo. A diferença é que lá o panetone com frutas ainda é o grande preferido da população”, diz Carolina Garofani.
A diversificação de sabores oferecidos é uma tendência que veio para ficar no Brasil: a cada ano novas opções de recheios e coberturas são oferecidas ao consumidor, agradando a diferentes paladares. Chocolate preto, branco, trufado, castanhas, maracujá, framboesa, pasta de avelã, paçoca e até bacon são algumas das variações encontradas.
Um dos tipos mais comuns, depois do chocotone, é o panetone de doce de leite, que rapidamente conquistou os consumidores brasileiros. Segundo a Havanna, empresa pioneira na fabricação dessa variação, o produto vendido no Brasil tem receita adaptada ao gosto dos consumidores do país, o que garante o sucesso. Prova disso é que para esse ano a empresa prevê um aumento de 30% nas vendas. A marca oferece duas opções: massa branca e doce de leite, e massa branca, doce de leite e gotas de chocolate.
Há cinco anos, o ParkShoppingBarigüi fazia uma promoção de Natal em que os clientes, a partir de um valor em compras, levavam para casa um panetone de doce de leite exclusivo. O produto não era encontrado para venda. A lembrança do sabor, que só era encontrado por meio da promoção, levou dezenas de clientes a pedir o retorno da campanha. Neste ano, o shopping não só atendeu as solicitações como também enviou uma das clientes que fez o pedido até a fábrica da Havanna, na Argentina, terra com tradição centenária na produção de doce de leite. O resultado desta ação você confere nesse vídeo.
Outros sabores de Natal
No Uruguai e na Argentina, outro doce que é obrigatório nas festas de fim de ano é o turrón navideño: uma barra de açúcar, mel e amendoim e que também pode ser preparada com uma variedade grande de ingredientes. O chef Leonardo de León também ressalta a cassata, uma sobremesa que alterna camadas finas de pionono – massa a base de trigo, açúcar e ovos – e sorvete.
Na Venezuela, destaque para o dulce de lechosa, uma espécie de conserva feita com papaia e açúcar, para o cabello de ángel , doce de abóbora preparado em forma de fios, e a torta negra – bolo que leva bebida alcoólica (em geral cerveja preta), castanhas e frutas cristalizadas. Na mesa das famílias colombianas o que não pode faltar é a natilla, uma espécie de pudim que leva leite, maisena, açúcar e rapadura. A sobremesa é servida acompanhada dos buñuelos, um bolinho frito similar ao nosso bolinho de chuva.
Os paraguaios também costumam comer nas festas de final de ano a sobremesa chamada de clerico – uma espécie de salada de frutas preparada com vinho e suco de frutas. No Chile, não podem faltar os mantecados, que são delicadas bolachas amanteigadas com aroma de limão e, no Peru, o mazapan, o nosso marzipã, um doce a base de ovo, açúcar e amêndoas.
O pão do Toni
Muitas lendas envolvem a origem do panetone, todas elas com um personagem em comum: o Toni. Uma das versões se passa no final do século XV, quando o Duque Ludovico ofereceu um banquete no castelo de Sforza para comemorar uma de suas conquistas. Porém, o doce que o cozinheiro havia preparado para a sobremesa queimou. Então, o ajudante Toni teria sugerido servir o pão com frutas que iria preparar aos seus amigos. Outra versão conta que o jovem padeiro Toni teria se apaixonado pela filha do patrão e, na tentativa de agradar o futuro sogro, criou a receita do pão doce. E uma terceira história conta que, no ano de 900, o assistente de padeiro Toni precisava assar pães e preparar uma torta para seu chefe. Como estava muito cansado, acabou se confundindo e colocou as passas na massa de pão. Tentando salvar a receita, decidiu adicionar o restante dos ingredientes que iriam para a torta: frutas, manteiga, açúcar e ovos. Nas três histórias, depois de agradar a todos que provaram, o produto ficou conhecido como “Pane di Toni”, ou “pão do Toni” e, com o tempo, passou a ser chamado de Panetone.
Massa madre: o segredo do panetone
A massa madre é uma mistura de água e farinha que mantém vivos os micro-organismos do fermento natural. Dessa massa, uma parte é adicionada aos outros ingredientes para preparar o panetone e outra parte é guardada para manter a corrente de vida e a qualidade do fermento. É a massa madre que determina a maciez e o aroma do panetone. Por isso, muitas indústrias mantêm salas com condições ideais de temperatura e umidade, garantindo a qualidade final do produto.
Origem controlada
Desde 2005, a Itália, na tentativa de manter a tradição, regulamentada por lei a receita do panetone. Os ingredientes e quantidades que devem constar na massa do pão doce para ele ser chamado de panetone devem seguir essa determinação. As frutas cristalizadas, por exemplo, precisam representar pelo menos 20% da quantidade de ingredientes. Caso não siga as regras, o produto perde o direito de ser vendido como panetone italiano.
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